UM PASSO ALÉM: O
QUE UMA EXPOSIÇÃO CIENTÍFICA A CÉU ABERTO PRECISA PARA ATENDER INDIVÍDUOS COM
SÍNDROME DE DOWN?
Wanderley Carvalho
Centro Universitário Padre Anchieta
RESUMO
Este artigo avalia um projeto
composto por exposições científicas em praça pública quanto ao seu potencial de
atender adequadamente indivíduos com síndrome de Down. O estudo, realizado em
2011 durante uma exposição sobre aranhas para a qual foram convidados alunos de
uma instituição especializada na educação de pessoas com a referida síndrome,
empregou a observação desses visitantes e entrevista com a docente que os
acompanhava. A análise, conduzida à luz da literatura pertinente, ao mesmo
tempo em que revela o ambiente da exposição como sendo altamente propício ao
trabalho de conceitos científicos junto ao público investigado, indica a
necessidade de estudos mais aprofundados sobre os recursos didáticos que
integram um trabalho dessa categoria.
INTRODUÇÃO
A
importância dos ambientes não-formais de aprendizagem em Ciências vem
aumentando progressivamente em todo o mundo, dado o seu potencial como recursos
a serviço da educação científica dos cidadãos, seja como apoio ao trabalho
formal desenvolvido por instituições públicas ou privadas de ensino, seja como
fonte direta de divulgação do conhecimento acadêmico junto ao público
não-escolar. Entre as peculiaridades que concorrem para esse potencial destacam-se: a) o visitante
geralmente comparece ao local por sua própria escolha e lá encontra opções
variadas de programas, fato que amplia o caráter opcional da visita; b) é comum
que as visitas incluam a possibilidade de interagir (tocar, manipular, testar
hipóteses) com materiais ou dispositivos que geralmente não se encontram disponíveis
em outros lugares e c) informação científica atualizada e de qualidade
encontra-se disponível de uma maneira que dificilmente ocorreria em outros
meios (THIER; LINN, 1976).
Em decorrência dessas
particularidades, os ambientes não-formais prestam valiosas contribuições, tais
como: estímulo à curiosidade; aumento da
motivação e das atitudes; promoção da interação social, da participação
e do enriquecimento pessoal; despertar do interesse pela Ciência e Tecnologia; auxílio para uma atenção mais concentrada e
para o desenvolvimento do domínio psicomotor e da compreensão de conceitos
abstratos (RAMEY-GASSERT; WALBERG III; WALBERG, 1994).
Com um perfil tão diferenciado,
não é de se estranhar que os ambientes não-formais estejam entre as opções de
intervenção voltadas ao desenvolvimento de capacidades de pessoas com
necessidades educativas especiais, notadamente as que apresentam déficit
intelectual, como é o caso da síndrome de Down (CALDEIRA et al., 2009). Há
quase uma unanimidade entre os educadores quanto ao interesse, envolvimento,
aumento da auto-estima e aprendizagem de conteúdos que esses espaços propiciam
aos alunos com tais necessidades, sejam eles crianças, adolescentes ou adultos
(ALVES, 2009).
Este trabalho versa sobre um
ambiente não-formal dedicado à difusão do conhecimento científico e seu
propósito de ampliar o caráter inclusivo que o acompanha desde a sua criação.
O CONTEXTO DO ESTUDO
Criado em 2002 com o nome de
“Ciência na Praça”, o projeto em cujo âmbito se deu a presente investigação integra
um conjunto de iniciativas de extensão universitária do Centro Universitário
Padre Anchieta. As exposições, que acontecem nas manhãs de sábado em uma praça
da região central de Jundiaí-SP, são concebidas, montadas e apresentadas por
equipes de alunos do 3o semestre do curso de licenciatura em
Ciências Biológicas da instituição. Os temas, eleitos pelos próprios alunos,
versam sobre assuntos pertencentes à
área das Ciências Naturais, com forte predominância da área biológica.
A estrutura básica das exposições
inclui uma tenda tipo gazebo com área de 9 m2 , quatro mesas
metálicas dobráveis de 0,6 m2 e dois painéis de 2m2.
Ocupando esse espaço, estão os alunos expositores, os visitantes e toda a sorte
de recursos ¾ espécimes, réplicas, maquetes,
cartazes, microscópios ¾ o
que torna o ambiente ali instalado algo extremamente dinâmico e interativo. O
público, composto por transeuntes da praça, interage intensamente com os
alunos-mestres, que os estimulam a interagir, também, com o material exposto.
Em suma, interação e diálogo são as grandes marcas das exibições, o que as
torna extremamente favoráveis à aprendizagem dos visitantes, conforme aponta
estudo realizado por Sampieri, Amaral e Carvalho (2009). A despeito disso,
ficam-nos dúvidas quanto à adequação das exposições para atender pessoas com
necessidades educativas especiais, tais como as que apresentam a síndrome de
Down.
OBJETIVO
Avaliar o Projeto “Ciência na
Praça” quanto ao seu potencial em atender indivíduos com síndrome de Down.
METODOLOGIA
A investigação foi conduzida no
primeiro semestre de 2011, durante uma exposição sobre o tema “Aranhas”.
Mediante convite dos expositores, três alunos de uma instituição educacional
especializada no atendimento de indivíduos com síndrome de Down compareceram à referida
exposição, acompanhados de uma professora.
A coleta de dados empregou os
seguintes instrumentos: a) observação dos visitantes, feitas tanto pelo
pesquisador quanto pelos alunos-mestres e b) entrevista com a docente que
acompanhava o grupo.
Na observação, o interesse recaiu
sobre a interação visitante-expositor e visitante-material exposto, além de
elementos indicativos de interesse, envolvimento e compreensão. Conversas entre
o pesquisador e os expositores, ocorridas após a exposição, permitiram confrontar
e sintetizar os dados obtidos por ambas as partes.
A entrevista com a docente, por
sua vez, visou à obtenção de uma apreciação crítica geral do trabalho
desenvolvido sob a óptica de uma profissional especializada na educação de
pessoas com síndrome de Down.
RESULTADOS
A observação dos visitantes
revelou dados surpreendentes. Além do interesse demonstrado e da forte
interação que eles estabeleceram com os expositores e com os recursos
disponíveis, houve um grande envolvimento deles com as atividades lúdicas
propostas e uma clara demonstração de compreensão do conteúdo apresentado. Além
disso, a julgar pelas expressões faciais, aqueles convidados estavam encantados
com o que viam, ouviam e tocavam e não demonstravam ter qualquer dificuldade em
participar ativamente da visita.
Além de confirmar os achados
acima descritos, a entrevista com a docente agregou elementos relevantes no que
tange à atuação dos expositores. Para a educadora, merecem destaque, nesse
quesito: a) a atenção dedicada e a disposição em oferecer explicações por
quantas vezes fosse necessário; a compatibilidade da linguagem empregada com o
nível intelectual e cognitivo do visitante e c) a atuação pautada por um olhar
carinhoso e atento.
DISCUSSÃO FINAL
Os resultados parecem corroborar
o que a literatura afirma sobre visitas de portadores de necessidades
cognitivas especiais a espaços não-formais de aprendizagem. Contudo, é preciso
considerar que o tema da exposição investigada ¾ aranhas ¾ além de naturalmente atrativo para a maior parte
das pessoas, tratava de conceitos que
envolviam pequena ou nenhuma abstração, o que certamente constituiu-se em um
diferencial para que o interesse, o envolvimento e a compreensão dos visitantes
fossem mobilizados. Nesse sentido, os recursos utilizados mostraram-se
perfeitamente adequados para comunicar o que deveriam e, ao mesmo tempo,
conquistar o interesse dos visitantes. Diante disso, entendemos haver a
necessidade de novos estudos que, no âmbito do Projeto “Ciência na Praça”,
avaliem a adequação de recursos destinados ao trabalho com conceitos mais
abstratos.
REFERÊNCIAS
ALVES,
F. O que fazem os alunos com necessidades especiais no Pavilhão do Conhecimento
– Ciência Viva? In: III Encontro de Educação em Ciências – A Educação
Científica de Alunos com Necessidades Educativas Especiais, 2009, Águeda. Actas do III Encontro de Educação em
Ciências. Aveiro: Universidade de Aveiro, 2009, p. 67-70.
CALDEIRA,
M.H. et al. Actividades interactivas de Ciência para alunos com necessidades
educativas especiais – um estudo no Exploratório Infante D. Henrique. In: III
Encontro de Educação em Ciências – A Educação Científica de Alunos com
Necessidades Educativas Especiais, 2009, Águeda. Actas do III Encontro de Educação em Ciências. Aveiro: Universidade
de Aveiro, 2009, p. 55-66.
RAMEY-GASSERT,
L.; WALBERG III, H. J.; WALBERG, H. J. Reexamining Connections: Museums as
Science Learning Environments. Science
Education, v.78,
n.4, p. 345- 363, 1994.
SAMPIERI, B.R.; AMARAL,
M.L.R.; CARVALHO, W. O saber acadêmico foi às ruas. E os visitantes, o que
aprenderam? In: Congresso Nacional de Iniciação Científica CONIC-SEMESP,
9, 2009, São Paulo. Anais do 9o
Congresso. São Paulo: CONIC –SEMESP, 2009,
p. 1-11.
THIER, H. D.; LINN, M. C.
The value of interactive experiences. Curator, v.19, n.3, p. 233-245,
1976.
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