Fabiana De Lucca Munaier – Bacharel
em Comunicação Social e mestranda em Ambiente Construído e Patrimônio
Sustentável pela Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG) E-mail: fabianamunaier@gmail.com
Resumo: A reflexão desse texto é
parte de uma pesquisa para dissertação que está sendo desenvolvida e centrada
na questão da percepção dos moradores de cidades históricas com o patrimônio edificado
e a divulgação de informações sobre o mesmo. Através da cobertura pela imprensa
local do projeto de Revitalização do Largo Nossa Senhora do Ó em Sabará, será
avaliado o discurso desse acontecimento pela mídia e pelos sujeitos. São duas
perspectivas distintas que podem apontar características reveladoras.
Palavras-chave: Discurso. Mídia.
Patrimônio Cultural. Sujeito
Introdução
O patrimônio constitui registro de cultura,
expressão artística e história. A cooperação para preservação do estado da arte
e memória levando em conta as transformações e acontecimentos atuais buscando
um novo fazer, além de conhecimento da realidade concreta significa que
contribuições no sentido de enriquecer o instrumental teórico ou metodológico
disponível ou descobrir aspectos previamente ocultos são reconhecidas como item
fundamental. O olhar voltado ao Patrimônio Cultural nesse trabalho adota a perspectiva
de que as edificações históricas passam
por mudanças decorrentes das alterações dos contextos culturais e ambientais, nos
quais os indivíduos estão inseridos.
A comunicação por sua vez é um processo que envolve
o intercâmbio de informações para além de uma extensão
ou decorrência natural do conjunto de meios. Ela
afeta o que as pessoas pensam sobre si mesmas e como elas percebem as outras. Para
Quéré “o papel dos média é sem
dúvida, decisivo enquanto suportes, por um lado, da identificação e da
exploração dos acontecimentos, por outro, do debate público através do qual as
soluções são elaboradas ou experimentadas” (QUÉRÉ, 2005, p. 72-73). Assim como
a sociedade, a mídia é composta por discursos sobre fenômenos, acontecimentos e
transformações que em confronto com a realidade podem ou não ser incorporados
às dinâmicas e de diferentes formas.
Imprescindível
ressaltar que o trabalho se constrói na tentativa de aproximar do
âmbito da pesquisa o caráter interdisciplinar. Enquanto alternativa inovadora,
Mangine (2009, p. 208) o descreve como “desdobramentos de uma cultura
decorrente da formação, consolidação e expansão da ciência moderna” e Morin
(2003, p. 116) questiona "Afinal,
de que serviriam todos os saberes parciais senão para formar uma configuração
que responda a nossas expectativas, nossos desejos, nossas interrogações
cognitivas?”.
Não se pretende perder
de vista a disciplinaridade, mas sim vislumbrar a possibilidade de um diálogo
que aproxime saberes provenientes de diferentes campos do conhecimento, em uma
fala audível aos diversos interlocutores que tratam do tema.
Explorar discursos sobre o mesmo
acontecimento a partir de ângulos diferentes suscita alguns questionamentos: Qual
a fala do sujeito e qual o discurso da mídia? Existe um movimento de mútua
reflexão? Ele faz com que os elementos se aproximem ou distanciem? Tentar
articular o processo de compreensão em uma atitude permanente de troca, crítica
e reflexão é a proposta empregada nesta pesquisa que envolve Patrimônio
Cultural e Comunicação Social.
Vozes diversas
São
várias as expectativas de um discurso onde cada interlocutor tem sua percepção
e seus interesses. Para apreender com mais clareza como uma temática semelhante
pode ser tratada de maneiras distintas em função desses elementos, a sugestão
foi selecionar um acontecimento e observar como ele é comunicado e interpretado
por diferentes participantes.
O
projeto de Revitalização do Largo Nossa Senhora do Ó em Sabará tem duração
prevista para um ano e é executado pelo Instituto Yara Tupinambá. Com apoio da
prefeitura e governo do estado, as obras iniciaram em primeiro de Junho de 2012
e consistem em ações para recuperação da fachada do casario no entorno da
igreja. As questões burocráticas tiveram início a mais tempo e durante esse
período, os moradores foram convidados pelos órgãos envolvidos a participar de
reuniões, nas quais houve a apresentação e apreciação do projeto pela
comunidade.
Tratando de uma das maiores riquezas que compõe o patrimônio
histórico e cultural da cidade de Sabará, o projeto recebe destaque da mídia
local, que registra os episódios que considera relevante. Mas será que os
moradores do Largo do Ó compartilham da mesma visão? Pensando em observar os
componentes do citado acontecimento e suas respectivas falas, a metodologia
utilizada foi adequada à especificidade de cada um. Após levantamento e seleção
dos materiais pertinentes, o discurso da mídia será avaliado a partir das
publicações do jornal de maior circulação produzido pela imprensa local. Já os
indivíduos serão analisados através do contato rotineiro da pesquisa de campo
baseada em entrevistas não estruturadas e observação assistemática.
Escolhido por ser o jornal de maior tiragem e distribuição produzido
na cidade, a Folha de Sabará publicou três matérias referentes ao projeto de
Revitalização do Largo do Ó. A primeira em 22 de dezembro de 2011, a segunda em
16 de março de 2012 e a última em 08 de junho de 2012. Todas as edições fazem
um breve apanhado do projeto, mencionam representantes dos órgãos envolvidos e
suas manifestações pessoais, citam o valor e a procedência da verba, a
importância do local (no último parágrafo com texto praticamente idêntico nos
três exemplares) e frisam o envolvimento dos moradores apesar destes não apresentarem
opinião. A conotação em torno do acontecimento é favorável e utiliza de tom
positivo e otimista, construído através da fala de autoridades.
Nas pesquisas de campo já efetuadas, os moradores do Largo do Ó
apresentaram em suas narrativas algumas divergências. Apesar da aceitação de um
modo geral, acreditam que ainda existem falha e superficialidade no projeto. Um
morador e proprietário de comércio local diz que “a revitalização é para
embaçar a vista do povo”, pois está havendo pressa e economia nas obras. Mas há
também um sentimento geral de amor e identificação com o lugar, e mesmo quando
as pessoas não sabem mais sobre o assunto, manifestam apoio a qualquer
atividade que possa trazer benefícios. A característica marcante da comunidade
é a atenção e boa vontade com visitantes e turistas.
Correia
coloca que para o filósofo Schütz, os problemas não podem ser compreendidos sem
uma abordagem de ação, comunicação, intersubjetividade, significado objetivo,
estudo e análise das relações entre a interpretação do mundo da vida por parte
dos que nele vivem e agem e a interpretação do mesmo mundo pelo cientista
social (CORREIA, 2005, p.14). Portanto, com base nessa afirmativa, acredito ainda
serem necessários outros contatos com a rotina e diálogos com os atores locais
para exploração mais profunda do tema.
De acordo com José Reginaldo Santos (1996) o “patrimônio cultural”
no Brasil é uma modalidade discursiva de “narrativas nacionais” com o propósito
de construir memória e identidade. Em consequência afetam o modo como as
categorias sociais sentem-se parte da totalidade, podendo vir a ser construídas
discursivamente enquanto uma política cultural, visando à recuperação, defesa e
preservação (GONÇALVES, p.11-12). Enfim, a crítica concreta deve estar baseada em dados mais
sólidos e as observações até aqui ponderadas são apenas o reflexo do começo de
um processo que ainda tem muitos dados a coletar e avaliar para futura
demonstração mais próxima da realidade.
Considerações Finais
A
narrativa de um acontecimento pode variar nos objetivos e formas que vão de
acordo com as especificidades da época, local e seu respectivo contexto
cultural. O modo de agir, assim como os valores que se atribuem ao patrimônio
muda. Nesse sentido, os discursos não são genéricos, mas sim pontos de vista de
uma realidade histórica baseados em experiências e conformações individuais.
O Largo do Ó se constitui como
produção de sentidos consequentes da formação entre sujeitos e ambiente
construído a partir da interação entre os mesmos. O patrimônio cumpre um papel
além da beleza histórica e estética das técnicas de arquitetura. Verificar a
conformação do discurso patrimonial pela mídia e sujeitos envolvidos poderá
servir como ponto de partida para reflexões no sentido de aprimorar a conexão
dos processos em questão. Mídia, sujeitos e patrimônio são agentes em constante
diálogo e mutação.
Referências
CORREIA, J. C. A teoria da
comunicação de Alfred Schutz. Lisboa: Livros Horizonte, 2005.
GONÇALVES, J. R. S. A
Retórica da Perda: os discursos do patrimônio cultural no Brasil. Rio d
Janeiro: Editora UFRJ; IPHAN, 1996.
MANGINI,
F. N. R., MIOTO, R. C. T. A
interdisciplinaridade na sua interface com o mundo do trabalho. UFSC: 2009.
MORIN,
Edgar. A cabeça bem-feita: repensar
a reforma, reformar o pensamento. 8ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand
Brasil, 2003.
QUÉRÉ,
L. Entre facto e sentido: a
dualidade do acontecimento. Trajectos. Revista de Comunicação, Cultura e
Educação, Lisboa, n. 6, p. 59-75, 2005.
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